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E agora que só restam os retalhos,
restam também meus poemas, dizendo do resto de mim.
Índice

06 Prefácio
07 Olhares            42 Infinitas lembranças
08 Sou bicho-Deus     43 Singular
10 Ipê amarelo        44 Cio de amor
11 Reação             45 Átomo
15 Desanoitecer       46 Medidas de segurança
16 Sol-s-tício        47 Equações
17 Uma só vez         48 Viagem
18 Despedida          51 Peito ferido
19 Chuvarada          52 Semente-sementeira
20 Nada mais resta    54 Acaso
21 Selva-geria        55 Terra de ninguém
24 Simbiose           59 Veleiro-vadio
25 Amigo              60 Fome de amor
27 Eterno partir      61 Cárcere
28 Morfologia         62 Vida circunscrita
29 Mecanismos         63 Aviso
30 Momentos mágicos   64 Deserto
33 Reforma            65 Gaiola
34 Albumina           68 Futurismo
35 Vagabundo          69 Caroneiro
37 Apenas canto       70 Telefone
38 Insanidade         71 Disneylândia
39 Água do céu        72 Natal
Prefácio


Ácida. Carne crua. Provocante.
Se fosse música, seria rock.
Se fosse filme, seria suspense, aventura, tragédia.
Se fosse autobiográfico, seria surpreendente...
Assim é a poesia de Valeria Nobrega.
Escrita ao longo de mais de trinta anos, somente agora é publicada
e, pasmem, continua tão atual quando na época em que foi escrita
tamanha a carga emocional embutida.
Sejam nobres ou não, a poesia tem a capacidade de despertar
sentimentos autênticos: amor, raiva, ternura, medo, euforia,
desespero, paixão, solidão...
É para isso que a poesia existe: para provocar (sentimentos).
A coleção Fala Sim comemora com seu primeiro volume essa
explosão de sentimentos em forma de poesia.
Para dar fôlego ao texto exuberante: flores aqui e acolá.
Flores coloridas, vibrantes e expostas. Flores de Kenia Ribeiro.
Elas acrescentam ternura e leveza ao texto, ao dia, à vida.
A combinação Floral de Phoenix é atraente aos olhos de quem busca
uma inspiração, um ponto de vista, uma provocação.
Impossível ler sem se emocionar. Impossível ver sem se emocionar.

Bia Simonassi
Business Art Marchand
Olhares
...E quando chegares,
Não sei se iremos nos apresentar,
Comumente...
Não sei se te sentarás,
Simplesmente...
Não sei se entenderás,
Facilmente,
Se eu disser a ti
Que no meu olhar de solidão,
Achei solidão no seu olhar também...




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                                       Floral de Phoenix   | Valéria Nóbrega
Sou bicho-Deus
No plantio, nessa terra, fui golfinho e naveguei
meses no lago de uma barriga...
No dia em que a luz se fez, desesperado com o
inesperado, aos gritos, senti frio, desproteção e
as agressões das ferramentas que me separavam
definitivamente daquela água-morna que me
alimentou e me embalou.
Respirei e o oxigênio fez dor em meus pulmões.
Encolhido, entendi que golfinho deixei de ser...
Enrolado em panos, descobri-me mamífero-filhote:
um gato, bezerro, ou, quem sabe, onça-pintada. Às
vezes, um chimpanzé imitando sons, mexendo as
mãozinhas, arrastando-me em quatro patas.
Fui crescendo!
Ouvindo!
Entendendo, percebendo!
Quase nada compreendendo...
O mundo foi tomando conta do meu ser e do golfinho
já quase nada me lembrava.
O tempo passou!
De bicho-em-bicho, fui transmutado em bicho-gente.
Quando o corpo-humano-adulto se moldou, minha
alma se fez fera e – leoa – me perdi na selva-selvagem
dos animais carnívoros!
Vez ou outra, no cantinho de um riacho, voava:


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                                                         Floral de Phoenix   | Valéria Nóbrega
borboleta-livre e sonhadora. Noutras vezes - beija-flor -
plantava amor em corações sangrados por mágoas perfurados.
Leoa-mãe fiz nascerem outros golfinhos e neles identifiquei
minhas próprias mutações. Quando a vida de mim fez caça,
numa fera-fênix me auto-fecundei para parir na alma um
bicho alado e forte...
E descobri-me, finalmente, Semente-Eterna-Divina plantada
novamente na cartola-mágica dessa terra-mãe para repartir o
amor do Pai Celestial.
Bicho-Deus em transmutação de anjo cósmico da grande
morada ao lado do Criador, nosso Pai Eterno. Amém!




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Ipê amarelo
Foi no teu amarelo-ouro,
De tristeza e solidão murmurantes,
Que eu descobri a vida,
Em meio à mumificação dos jardins,
No cerrado costurados.
Foi no teu amarelo-ouro,
Sustentado por galhos secos,
Que eu vi a tua esperança em vida,
O teu inconformismo na morte,
O teu grito de amor aos estéreis esqueletos inertes,
À pasmaceira do olhar que te descobre
... E por esse quase-nada
Descobre-se o que ainda-é-tudo.
Percebe-se que, apesar do cinza-mortalha,
Nesta terra alguém está vivo, em amarelo solar de energia!
...E por um quase-nada,
Apenas um ser em flor,
Solitário na grama cinza:
É preciso ser valente,
Fazer festa sobre as mortalhas,
Explodir em vida
A seiva divina da procriação perpetuadora,
Apesar...




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Reação
Grita!
Senão o mundo massacra você,
Como massacra a britadeira as pedras inertes.
Fala!
Vomita as úlceras e hérnias,
Movimenta o corpo,
Antes que seu próprio sangue deixe de circular,
Antes que seus músculos parem,
Entorpecidos, alheios à translação.
Não pára!
“Se ficar o bicho pega”,
E correndo pode ser que escape.
Anda!
Levanta do macio ortopédico de cetim,
Tira o pé do chinelo aveludado,
Vai correr pelas calçadas,
Chutando no gramado uma bola sem compromisso.
Surfa na onda da vida,
Vencendo seu próprio medo,
E a inércia do cotidiano.
Arregala os olhos para o mundo
E vê o que ainda resta dele:
Dos seus jardins-lixo,
Das suas crianças-lixo,
Das cinzas nas matas:


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Tudo carvão.
Abra os braços e espreguiça,
Arrota o comodismo hereditário,
Que o tempo está passando!
Enfrenta, fica gigante,
Ainda que para isso seja preciso
Agredir todos os contextos-monótonos
Do seu status social com suas estruturas burguesas.
Esqueça as programações tirânicas dos códigos mofados:
Abandona o sistema castrador,
Deixa seu cadastro-caduco,
Deixa de ser acessório da engrenagem consumista.
... E, por último, faça uso-capeão da sua ilha,
Toma posse de você!




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Surfa na onda da vida,
vencendo seu próprio medo.
Desanoitecer
...E agora que os fantasmas se vão,
Carregados pela madrugada,
Montados em copos e rótulos:
Já não sangra mais a ferida aberta,
Já não dói tanto a dor escondida.
Agora que o sangue jorrado
Misturou-se no riso,
Agora que o soluço sentido
Confundiu-se no canto dos cantos da rua.
Agora que os fantasmas se foram,
Posso ir-me também,
Só, com a minha solidão,
Só, como em todas as voltas...
[1976]




                                                                           15
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Sol-s-tício
O sol está morrendo
Em entretons de vermelho e laranja.
O dia está no fim
Para que a noite aconteça
Em luares de prata...
Pardais apressados procuram seus ninhos.
As árvores adormecidas, embaladas pela brisa que sopra suave,
Sobre a terra morna.
Ao longe, o piar de algum pássaro notívago,
Que, como eu, não conseguirá dormir,
Que, como eu, não achará seu ninho,
Não sentirá a brisa,
Não será embalado...
Ficará só,
Só,
Observando os que estão em paz,
Só,
Ouvindo o ressonar tranqüilo
Dos que ainda são felizes...




                                                                                       16
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Uma só vez
Quem verdadeiramente amou,
Sabe que nunca mais de uma vez:
Porque a dor do amor
Nascido,
Sentido
E inexplicavelmente desaparecido
É intensa, grande,
E possessiva dos espaços e tempos.
Quem, n’alguma vez amou,
E deste amor naufragou:
Encolheu-se,
Escondendo-se
Na solidão abraçada.




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                                     Floral de Phoenix   | Valéria Nóbrega
Despedida
Pior que ficar
É ter que ir.
Aqui um resto de mim em tudo
Lá, só o relógio preguiçoso
Que não corre para a noite chegar.
“Felicidade” não foi embora:
Ficou em cada lembrança,
Disfarçada em saudade...




                                                                     18
                                     Floral de Phoenix   | Valéria Nóbrega
Chuvarada
A chuva ensopa a vidraça,
Onde tanto sol já bateu.
Curva as árvores,
Molha os pássaros,
Transborda os ninhos...
Por todo lado lama escorrendo,
Gente encolhida, sem vontade de nada...
Alma dormente, mente-dormente, fogo ausente...
É inverno!
Inverno nos jardins,
No céu e nas ruas.
É inverno lá fora,
É inverno em mim...




                                                                                 19
                                                 Floral de Phoenix   | Valéria Nóbrega
Nada mais resta
As lágrimas disparam carreira no meu rosto,
Onde o peito fez gigantescas crateras.
Tanto passado me alucina,
Tanta solidão me enlouquece.
Em minha rua deserta,
Nenhuma janela aberta,
Ninguém a me esperar...
Como ocultar
A dor em mim suspensa?
Como ocultar
Um coração intranqüilo,
Que morre de fome e sede
De lembranças inexistentes,
Agora que nada mais resta da paisagem
De grandes ilusões frustradas,
Agora que só resta o vazio
E a ânsia das palavras
Murmuradas ao vento...




                                                                              20
                                              Floral de Phoenix   | Valéria Nóbrega
Selva-geria
Mora em mim
Uma tristeza forte,
Constante e imutável.
Mora em mim
Uma fera devoradora,
Implacável e assassina.
Um bicho-grande
Que me amedronta,
Um bicho-mau
Que me apavora.
Mora em mim uma tristeza-fera
A me arranhar com as garras,
A me morder com as presas,
A me queimar com seu fogo.
Mora em mim
Um fantasma,
Uma força bruta,
Que me rouba o riso
E me carrega ao inferno:
A lágrima louca;
O grito rouco
Da solidão indomável.




                                                                21
                                Floral de Phoenix   | Valéria Nóbrega
Alma dormente, mente-dormente,
fogo ausente... é inverno!
Simbiose
Esta solidão, tão minha,
Eu a penetro
E por ela sou devorada.
Dentro de mim nós nos perpetuamos:
Ela me fecunda e eu a gero
Como o sol gerou a chuva
Como a chuva gerou o mar.
Coexistimos em proximidade
Nos infinitos opostos,
Que sem se tocarem
Se unem no além:
No inexplicável espaço
Entre o sol e o mar...




                                                                     24
                                     Floral de Phoenix   | Valéria Nóbrega
Amigo
Em um lugar qualquer;
Em sendo qual for a hora;
Vestido em cor preta ou branca;
Mesmo não sabendo usar pincéis;
Nem solfejar notas musicais;
Mesmo não dizendo poemas...
Em um lugar qualquer
Poderás fazer um amigo.
E a ele não interessarão os teus mestrados,
Nem a tua cultura e quinquilharias...
Porque não precisas de nenhuma técnica
Para conseguires amigos.
Terás apenas que saber ouvir,
Quando ele precisar falar,
E terás que falar no momento exato
Em que ele precisar ouvir-te.
Não precisarás ser puro, nem de todo impuro,
Mas não poderás ser vulgar.
Terás que ter ressonâncias humanas e siderais,
Quando todas as respostas dele forem cibernéticas.
E não precisarás saber do Picasso,
Dos noturnos e das “polonaises”;
Mas terás que senti-los,
Como sentes as gotas de chuva e de orvalho;
Como sentes o anoitecer,


                                                                                     25
                                                     Floral de Phoenix   | Valéria Nóbrega
O riso e o pranto.
Terás de ser adulto,
Quando ele disser “coisas infantis”;
E terás que ser criança para fazê-lo sorrir,
Quando ele estiver envelhecendo em preocupações.
Terá que ser tudo isto, e além de tudo,
Terás que lembrar-te de que não és máquina-programada,
E que por essa razão poderás errar um pouco,
Para talvez no momento da tua falha
Descobri-lo teu amigo também...




                                                                                         26
                                                         Floral de Phoenix   | Valéria Nóbrega
Eterno partir
Sou como a estrela parada e sem luz,
Num oceano de melancolia.
E tudo em mim busca amor
E não há amor em lugar algum...
Vivo um eterno partir,
Na minha vontade louca de ficar...
Se olho o céu, me sinto tonta
Com a quantidade de estrelas,
Fico cega, com tanta luz;
Acostumada que estou
Com o negrume cá debaixo.
E ao descobrir estrelas que se movem,
Descubro também que a vida continua,
Que o tempo não parou,
E que só em mim existe morte...




                                                                        27
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Morfologia
Não sendo capelo ou gaivota,
Não sendo soldado guerreiro,
Nem o Vietnã conhecendo,
Não sabendo dos horizontes distantes,
Não sendo muito tubarão,
Nem tão pouco piabinha;
Perco-me nas entrelinhas,
Sem definição dos espaços,
Sem tempo marcado,
Nas marcas de amor...
Históricas crateras,
De extintos vulcões em geografia distinta
Na mutilação morfológica...




                                                                            28
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Mecanismos
Penso, logo existo!
Mas não existo só porque penso.
Máquinas não pensam e existem!
Condicionadas pela precisão mecânica:
Eu condicionada pelos condicionamentos
Mecânicos-psicológicos.
Alimento as máquinas
E elas mesmas me alimentam.
O corpo da máquina é como meu corpo:
Que se alimenta, se cansa e um dia
Deixa de funcionar.
A meu favor
Apenas a opção da autodestruição.
Do querer desligar porque tenho frio, calor ou sono.
Do poder deixar a máquina,
E fazer o cérebro viajar,
E transpor em tempo e espaço
As correntes aprisionadoras:
Capazes de conter máquinas,
Porém nunca a mente livre.




                                                                                       29
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Momentos mágicos
Existem momentos mágicos
Eternos...
Existem momentos cristalizados
Em tão pequenas lembranças...
Existem momentos viajantes do tempo
E do espaço
Momentos posseiros dos nossos pensares
Cravados nos ponteiros deste relógio neurológico,
Marcando este tempo de solidão...
Eu tenho estes momentos,
E deles sou escrava
Querendo escravizar você!




                                                                                    30
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E ao descobrir estrelas que se movem,
descubro também que a vida continua.
Reforma
Da tua estrada faço minha viela,
Se do meu atalho fizeres estrada
... E planto margaridas e violetas,
Onde fizestes existir asfalto e concreto
... E rabisco poemas em cima dos teus extratos bancários.
... E troco teu DVD
Por um dedilhar de viola,
Teus projetos racionais,
Por um bilhete de amor.
... E destruo as marcações da pista pavimentada
Para dar-te a liberdade
Das tuas próprias limitações,
Que também são minhas,
Em contextos opostos...




                                                                                            33
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Albumina
Preciso que ressurjas em mim, agora
Como a fé nos desesperados surge.
Para que eu possa
Levar uma gota de orvalho
Desta terra amaldiçoada,
Onde só em ti
Me encontrei
Quando sem ti já nada mais importava.




                                                                        34
                                        Floral de Phoenix   | Valéria Nóbrega
Vagabundo
Louco vagabundo da noite,
Rouco Romeu – trovador
Sua boca eu apenas escuto
Pois embora seja vacinada
Sua mordida não me morderá!
Poeta dos substantivos
Femininos plurais,
Não faça mais versos aos nomes
Pois são apenas os rótulos,
Dos conteúdos
Que você não percebe.
Ah, jovem narciso
Quanto vazio por traz desse espelho,
Quanta solidão debaixo daquela cama,
Quanto automatismo no abater das lebres.
A sua disritmia,
Que a tanta mulher enlouquece
É a mesma da qual queria você isentado.
Acorda esta cabeça,
Faz descansar seu sexo-viciado
Faz acordar seu sentimento!
Pára de criar fantasias,
De sonhar utopias,
De fazer alegorias.
Deixa de ser o rei momo


                                                                           35
                                           Floral de Phoenix   | Valéria Nóbrega
Para na veste de um pierrô
Ser apenas um figurante
Da sinfonia global.
Louco homem, eu, mulher louca também,
Velha guerreira das dores,
Por uma questão estratégica
Vou aumentar nosso espaço
E me fazer disparar no vento...
Adeus!




                                                                        36
                                        Floral de Phoenix   | Valéria Nóbrega
Apenas canto
Canto uma esperança desatinada,
Canto uma paz que não tenho...
Canto como louca,
Enquanto meu peito chora num soluço, a dor da solidão.
Ah! Se soubessem o que vai em minha alma,
Ah! Se soubessem de mim,
Na certa zombariam,
Na certa se afastariam:
Por isso canto:
Para que não saibam do choro fantasiado de canto...




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Insanidade
Nas noites insones do meu cansaço vadio;
Na solidão do silêncio irritante, estático e profundo;
Agredida pelo luar que estupra as cortinas exigindo passagem;
Pairando nos espaços de tempos antigos, em monólogos estéreis;
Na magia macabra das dores guardadas;
Ressoa no ar um grito esganiçado,
Erguendo da cama
O corpo trêmulo da mente confusa:
Porque as paredes se movem e o teto, num bailado convulsivo,
Flutua em espaços abertos de horizontes purpúreos.
Porque os livros enfileirados na prateleira poeirenta
Entoam canções natalinas para os duendes risonhos que
pululam nas jarras,
Porque tudo enlouquece numa mutação incompreensível...
E quem foi já não é mais,
Quem quis ficar teve que ir,
Quem era mudo, falou,
E quem objetos usava, virou objeto agora.
Para ser usado também...




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Água do céu
Como aquela árvore
Ou como aquela flor,
Há dias que te esperava.
E chegastes na luz dos raios, no barulho dos trovões
Voltastes a mim,
E me encontrastes como na última vez:
Só, na vidraça embaçada a esperar.
Me sinto em paz,
Sem angústia,
Sem solidão,
Agora que tuas gotas molham as árvores e o vidro...
Por que demorastes a vir?
Eu aqui esperando para uma conversa,
Para não me sentir tão sozinha, valsando em espera.
Ficarás por um momento,
E conversaremos:
De poesia, madrugadas e estrelas...
Entrarás pela janela aberta inundando meu corpo,
Molhando os meus cabelos.
Entre, chuva,
Vem fazer cachoeira em mim...
[18 de outubro de 1973]




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E planto margaridas e violetas,
onde fizestes existir asfalto e concreto.
Infinitas lembranças
Não se esqueça...
Não se esqueça dos meus rios,
Minhas matas
Minhas grutas
Não se esqueça...
Dos gemidos,
Dos voares em céu aberto
Não se esqueça de nada.
Não deixe a saudade acordar.
Não programe nada.
Não defina.
Não equacione.
E, principalmente:
Não multiplique, não some,
Nem divida.
Apenas não se perca no espaço,
Apenas não se esqueça de mim
Apenas,
Nos deixe existir...
[19 de julho de 1979]




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                                 Floral de Phoenix   | Valéria Nóbrega
Singular
Eu,
Solidão
Bicho-fera
Ilha:
Em espaço – isolada
Eu,
Pedaço
De dimensão-programada
Em infinito deserto.
Eu,
Noite de inverno
Vazia – calada!
Eu,
Primeira pessoa
Do singular nós
Eu,
Monossílabo!




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                         Floral de Phoenix   | Valéria Nóbrega
Cio de amor
É neste cio de amor
Que te procuro
Madrugada morrendo
Morrendo de solidão:
Louca vontade
Rouca de beijos
Rolando no tempo,
Morrendo na insônia
Acampada nos lençóis...
Na mesma cama de ontem...




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                            Floral de Phoenix   | Valéria Nóbrega
Átomo
Um ponto branco,
Branca areia contra o mar
O sol me toca
E eu nada mais sou que um ser
Possuído pela grandeza cósmica...
Quando a escuma me beija,
E em bolhas lambe os meus pés,
Eu me entrego com indolência e passividade...
E na lentidão compassada dos seres cósmicos
Imensos, eu aprendo a possuir,
Sem me apossar,
Sem deixar de ser
Nada mais que um ponto:
Só, na areia fria!




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                                                Floral de Phoenix   | Valéria Nóbrega
Medidas de segurança
Mantenha a porta fechada:
Não deixa entrar
Nenhum amor por descuido:
Não deixa acampar.
Cerca suas terras
Com cercas de arame,
Tranca as janelas,
Não deves se arriscar.
Mantenha a porta fechada
Esquece da vida:
Não vale tentar.
Percorra as noites, os dias: sozinha.
Engole o sorriso, o pranto,
E mesmo sem encanto
Fique no seu canto.
Até a dor se acalmar....
(1979)




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                                        Floral de Phoenix   | Valéria Nóbrega
Equações
Para que placas, leiloando
Alardeando publicamente, vendedores.
Para que prados, pradarias, formalizados
Para que praias, lamentando pranto:
Quartzo prateado.
Para que prateleiras, fragilmente presas:
Predestinadas.
Para que prece, proferida, irrefletida:
Determinada.
Por que prazo,
Calculado?
Possível antecipação:
Precipício,
Matrix!




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                                            Floral de Phoenix   | Valéria Nóbrega
Viagem
... E porque
Não moras no mar
Terei que esperar pela chuva,
Para na enxurrada da rua,
Chegar à tua calçada.
Pra quem sabe
Fazer-te estrada,
Embora
Prefiras vielas...




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                                Floral de Phoenix   | Valéria Nóbrega
E porque não moras no mar,
terei que esperar pela chuva.
Peito ferido
E te amo
Numa loucura tão insana,
Tanto insano se fez o coração
Te amo
Te quero
E preciso de tudo
Que me mostras agora
Para depois
Esconder nalgum poço
Todo o medo
Desta loucura
E preciso esquecer
Que me fiz máquina
Pra sendo tua
Perder o medo,
E te amar longe das delimitadas-limitações...




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                                                Floral de Phoenix   | Valéria Nóbrega
Semente-sementeira
Acho que foi o vento,
Ou talvez a maré
Que trouxe um dia
A plantinha nova:
Semente,
Pra junto da velha planta:
Sementeira
... Sei lá, se foi a surpresa do encontro
Sei lá, se foi o chegar sem licença
Naquelas terras tão próprias.
Quis a semente
Ser sementeira,
Sementeira
- semente.
Nesse querer de mutualidade
Semente – sementeou
Sementeira – semeou
Semente
Ensinando sonho
Sementeira
Sem sonho ensinou
E juntas pensaram que
Bom seria
Se o vento fosse dormir
E a maré aquietasse...


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                                            Floral de Phoenix   | Valéria Nóbrega
Que bom seria
Tivesse a semente
Ser sementeira sempre
Não tivesse a sementeira
Semear-estéril...




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                           Floral de Phoenix   | Valéria Nóbrega
Acaso
Olha, moço
Sabemos que foi sem querer,
Ou talvez,
Por querermos demais
Sabemos um montão de coisas
E ao mesmo tempo,
Sabemos um montão de nada
E sei também
Que você não sabe,
Que na minha embriaguez
De desamor
Você fez acontecer
Uma vontade doida de amar,
Uma sede enorme de você...




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                              Floral de Phoenix   | Valéria Nóbrega
Terra de ninguém
És a gaia,
Da crosta fingidamente estéril.
És a cabeça-viking,
Desse coração italiano,
Dessas manias piratas
És o solo
A se satisfazer com os ciganos
Que em ti acampam, pra uma noite de festa
És a terra,
Que frutificou em vão,
Sem da colheita receber a sombra
És o canteiro,
Que recusa a semente
Pra dela não ser privado.
Que recusa o posseiro,
Pra nele não se subjugar.
És terra de ninguém
Sem ninguém para te cultivar
... E quando os ciganos se forem,
Deles só restando cinzas e ecos de gargalhada
Talvez, de tuas entranhas não possa mais brotar
Ao menos, a semente última.
Talvez, o olhar as fogueiras que um dia
Te fizeram arder, te faça chorar num repente
Pelas sementes que te negastes a receber


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                                                  Floral de Phoenix   | Valéria Nóbrega
... E descobrirás, então, que por algumas
Colheitas perdidas, perdestes também a tua
Própria razão de existir.
E te descobrirás verdadeiramente mumificado:
A terra em todas as camadas, estéril!
(1978)




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                                               Floral de Phoenix   | Valéria Nóbrega
Acorda esta cabeça, faz descansar seu sexo-viciado,
faz acordar seu sentimento!
Veleiro-vadio
Era um mar imenso:
- fechado
Rodeado por montanhas:
- fechadas
E barco nenhum era permitido
E pássaro nenhum sobrevoava...
Mas o veleiro chegou:
- aberto
No espanto da fera só,
As ondas
Quedaram-se:
- quietas...
Dias e noites, veleiro e mar naquela
Dança medrosa, de ritmo lento,
Se conhecendo, se devassando,
Parados no tempo, se prometendo...
Hoje, velas abertas,
O veleiro se vai...
No mar, as ondas se escumam num
Beijo final
Nas montanhas, as matas-molhadas soluçam,
Pedindo que os ventos se calem,
Que façam o veleiro ficar...
[1979]



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Fome de amor
Se eu me tivesse,
Eu não me deixaria ser assim consumida,
Não teria essa alegria sumida
Não seria este ser sem jeito.
Se eu me tivesse,
Não teria este útero bêbado,
Embriagado de desamor.
Não teria esta garganta seca,
Em grito, morta-esquartejada;
Este peito mudo, surdo e incompetente
Esta fome doida,
Incontida.
Esta fome velha,
Imutável.
Esta fome de você,
De amor, murmúrios e risos.
Esta fome me devora:
Suga meu sono
Come minha fome
Dorme comigo,
Quando acordamos,
Um cigarro nos lábios
Nos faz sentir beijando você.
Se eu me tivesse,
Na certa teria você...
[28 de julho de 1980]

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Cárcere
Quem és tu, pesadelo humano;
Destruidor mutilante de ideais filosóficos;
Carcereiro do espírito,
Semeador de ervas malfazejas?
Quem és tu, fantasma umbilical;
Carniceiro noturno dos pensamentos fugidios?
Não vês, por acaso, que já destruístes bastante;
Não percebes que agora só restam os restos;
Que nada mais encontrarás para teus banquetes
alienados?
Quem és tu, pesadelo humano?




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Vida circunscrita
Pensando,
Matutando,
Ensimesmando...
O olhar parado, perdido em algum horizonte;
Os braços caídos, inertes ao longo do corpo;
Os pés descalços, pendurados na amurada;
Os cabelos esvoaçando ao vento dos pensamentos distantes...
Tanto tempo, caminhos e gente;
Tanto acontecer;
Tanto andar...
E agora a idéia da estrada em círculos
Imutáveis sufocantes.
No círculo de círculos infindáveis, os mesmos medos,
As mesmas angústias, o mesmo posicionamento contrário.
Pensando,
Matutando,
Ensimesmado,
Sufocando-se em perguntas,
Angustiando-se nas respostas.
O corpo parado, inerte e estático.
A mente agitada e confusa
Debatendo-se
Nas paredes do crânio...




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Aviso
Não se aproxime:
Se seus olhos não forem horizonte,
Se sua boca não salivar amor,
Seu peito não rufar sonhos.
Não precisa chegar, nem passar, nem olhar:
Se o sêmen não ejaculado semear esperança
De plantios, colheitas,
Gosto de favo e de mel.
Dispenso seu esqueleto-ôco,
Sua íris mortiça,
Seu peito calado,
Sua boca seca.
Dispenso seu pedaço,
Porque preciso do inteiro...




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Deserto
Agora, nesta rede calada,
As folhas paradas:
Não resta ninguém...
A lua dormente passeia no manto,
Procura meu canto,
Encontra meu pranto:
Não resta ninguém...
Chega o sol atrevido
Invadindo o silêncio,
Lambendo a dormência.
Remexe em tudo,
E tudo é um nada:
Não resta ninguém...
O mar beija a areia fazendo escorrer as pegadas,
Roubando as marcas
Da trilha de volta do meu pescador
Na rede inerte, enxarcada de solidão
Uma mulher se esvai
Em hemorragia
De pranto final,
Solitária:
Não resta ninguém!




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Gaiola
Na noite escura, parada e deserta,
Paira no ar um grito incontido,
Abortado num choro de mágoas envelhecidas,
Estraçalhado em desejos rompidos,
Embrutecido nas dores revividas...
Na noite cansada, muda e inerte,
Como pássaro noturno, engaiolada:
De asas partidas, peito ferido, bico quebrado,
Esvoaçando prisioneira na gaiola de prata,
Com cadeado na porta...
Nas angústias de ontem,
No desespero de hoje,
Na incerteza do amanhã;
As neuroses adquiridas, decoradas e repetidas,
As manias insolentes, inoportunas e chatas,
As carências aumentadas e multiplicadas...
Na noite escura, parada e deserta,
O pássaro doente se acomoda no ninho vazio.
Cansado da vida,
Cansado do seu cansaço imutável,
Cansado dos contextos impostos,
Sem horizontes,
Sem abertura...




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Não se aproxime se seus olhos não forem horizonte, se
sua boca não salivar amor, seu peito não rufar sonhos.
Futurismo
Choro lágrimas sobre o cadáver ainda morno,
Desse passado adolescente.
E no meu ser todas as agitações se anulam,
Como as vozes nos campos moribundos.
Nesta rua, agora deserta, a minha alma passeia,
Desolada;
Porém vagueia serena.
Tão serena quanto só pode ser quem se sente só,
Como os veleiros nos portos silenciosos.
Preciso que surjas em mim,
Como a fé nos desesperados surge
Para que eu possa levar uma gota de orvalho,
Deste oceano de água e sal.
Preciso de ti agora,
Que só ficou o vento frio a soprar nas minhas faces
E a terra inerte a escorrer nas minhas mãos.
Preciso que surjas agora,
Quando tudo é estranho e silencioso, como um gemido,
Quando estou acorrentada por mim mesma,
À terra que sou eu mesma...
Quero me abandonar a ti,
Como a onda se abandona ao mar:
Silenciosa, com lassidão...
Pra fazer do passado uma lembrança envelhecida...



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Caroneiro
Surgiste na vida, repentinamente,
Sem acontecimentos diferentes,
Sem velas, sem vinho, sem guitarra...
Surgiste em mim,
E eu pensei que serias passageiro,
Que acabarias logo.
Que serias só por instantes,
Que nos separaríamos depois,
E nunca mais nos encontrássemos.
Mas saiu tudo diferente.
Foste ficando,
Me ensinando a gostar,
Me ensinando a te querer mais,
Por um pouco mais...
A culpa foi tua que mentiste.
Também minha, porque acreditei.
Sorte tua que me ganhaste.
Azar o meu que te perdi,
Depois de acreditar
Que serias pra sempre...
Azar o meu...




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Telefone
Na nebulosa incômoda do teu rosto escondido,
Na estranha distância de tanta proximidade,
No querer conhecer a matéria dessa energia sonora.
Na hipótese de um muro,
Erguido ao acaso dos condicionamentos sociais,
Impostos, aceitos e desfrutados;
A minha inquietude se faz presente
Nos raciocínios balanceados,
Nas neuroses escondidas dos sonhos massacrados...
Na nebulosa incômoda das verdades escondidas,
Uma possibilidade de fuga,
No extravasamento dos desejos contidos,
No fundo do poço escondidos...




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Disneylândia
Se eu fosse a Mônica,
O Cebolinha ou o Mickey,
Você viria mais cedo
Pra ficar comigo.
Mas por não ser nenhum deles
Fico aqui jogada num canto,
Mais parecendo o Pateta.




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Natal
Nas árvores enfeitadas,
No movimento das ruas,
Nas mesas fartas:
Está escrito Natal!
Só não o vejo em mim, em você,
Nem nas pessoas agitadas que passam correndo.
Não vejo nenhuma ajuda ao cego que atravessa a rua de crianças e
velhos vestidos de fome, frio e abandono....
O que vejo bem são os doentes dos hospitais
A esperarem em vão um abraço apertado, a dor apartada..
O que sei é que nos asilos e orfanatos,
Nos casebres e abrigos
esperam um Papai Noel que não virá: nunca passou, nem ficou...
Ah, Natal!
Você me disse que hoje se comemora o nascimento de Cristo...
Como descobri-lo nas pessoas apressadas que me empurram ao passar,
Como descobrir o Natal em você que se fez dono da festa de aniversário
Para afogar-se feliz, no vinho, nas castanhas e nos presentes.
Como achar Natal em mim,
Se desconheço o perdão,
Se vejo erros e não faço acertos,
Não conserto nada,
Nem mesmo, eu mesma.
Nas árvores enfeitadas para o Natal,
A minha oração aos que nos brancos quartos de hospital,


                                                                                        72
                                                        Floral de Phoenix   | Valéria Nóbrega
O sangue injetado de drogas,
Rezam pela graça de sua cura,
Por um sonho infindo só de esperanças acalentado...




                                                                                      73
                                                      Floral de Phoenix   | Valéria Nóbrega
Livro composto nos tipos
NuSwift e Pristina.



Versão impressa para presente
pode ser encomendada pelo
bia@projectsim.com

Nossa missão é ajudar
pessoas [físicas e jurídicas]
a transformarem idéias em
projetos e projetos em real ação
[ou realização].

Nosso negócio é lidar com idéias.


Agradecimentos especiais para
Biagio Beatrice e Alexandre
Brandão pelo apoio técnico.




Todos os direitos reservados.

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Floral de Phoenix

  • 1.
  • 2.
  • 3.
  • 4. E agora que só restam os retalhos, restam também meus poemas, dizendo do resto de mim.
  • 5. Índice 06 Prefácio 07 Olhares 42 Infinitas lembranças 08 Sou bicho-Deus 43 Singular 10 Ipê amarelo 44 Cio de amor 11 Reação 45 Átomo 15 Desanoitecer 46 Medidas de segurança 16 Sol-s-tício 47 Equações 17 Uma só vez 48 Viagem 18 Despedida 51 Peito ferido 19 Chuvarada 52 Semente-sementeira 20 Nada mais resta 54 Acaso 21 Selva-geria 55 Terra de ninguém 24 Simbiose 59 Veleiro-vadio 25 Amigo 60 Fome de amor 27 Eterno partir 61 Cárcere 28 Morfologia 62 Vida circunscrita 29 Mecanismos 63 Aviso 30 Momentos mágicos 64 Deserto 33 Reforma 65 Gaiola 34 Albumina 68 Futurismo 35 Vagabundo 69 Caroneiro 37 Apenas canto 70 Telefone 38 Insanidade 71 Disneylândia 39 Água do céu 72 Natal
  • 6. Prefácio Ácida. Carne crua. Provocante. Se fosse música, seria rock. Se fosse filme, seria suspense, aventura, tragédia. Se fosse autobiográfico, seria surpreendente... Assim é a poesia de Valeria Nobrega. Escrita ao longo de mais de trinta anos, somente agora é publicada e, pasmem, continua tão atual quando na época em que foi escrita tamanha a carga emocional embutida. Sejam nobres ou não, a poesia tem a capacidade de despertar sentimentos autênticos: amor, raiva, ternura, medo, euforia, desespero, paixão, solidão... É para isso que a poesia existe: para provocar (sentimentos). A coleção Fala Sim comemora com seu primeiro volume essa explosão de sentimentos em forma de poesia. Para dar fôlego ao texto exuberante: flores aqui e acolá. Flores coloridas, vibrantes e expostas. Flores de Kenia Ribeiro. Elas acrescentam ternura e leveza ao texto, ao dia, à vida. A combinação Floral de Phoenix é atraente aos olhos de quem busca uma inspiração, um ponto de vista, uma provocação. Impossível ler sem se emocionar. Impossível ver sem se emocionar. Bia Simonassi Business Art Marchand
  • 7. Olhares ...E quando chegares, Não sei se iremos nos apresentar, Comumente... Não sei se te sentarás, Simplesmente... Não sei se entenderás, Facilmente, Se eu disser a ti Que no meu olhar de solidão, Achei solidão no seu olhar também... 7 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 8. Sou bicho-Deus No plantio, nessa terra, fui golfinho e naveguei meses no lago de uma barriga... No dia em que a luz se fez, desesperado com o inesperado, aos gritos, senti frio, desproteção e as agressões das ferramentas que me separavam definitivamente daquela água-morna que me alimentou e me embalou. Respirei e o oxigênio fez dor em meus pulmões. Encolhido, entendi que golfinho deixei de ser... Enrolado em panos, descobri-me mamífero-filhote: um gato, bezerro, ou, quem sabe, onça-pintada. Às vezes, um chimpanzé imitando sons, mexendo as mãozinhas, arrastando-me em quatro patas. Fui crescendo! Ouvindo! Entendendo, percebendo! Quase nada compreendendo... O mundo foi tomando conta do meu ser e do golfinho já quase nada me lembrava. O tempo passou! De bicho-em-bicho, fui transmutado em bicho-gente. Quando o corpo-humano-adulto se moldou, minha alma se fez fera e – leoa – me perdi na selva-selvagem dos animais carnívoros! Vez ou outra, no cantinho de um riacho, voava: 8 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 9. borboleta-livre e sonhadora. Noutras vezes - beija-flor - plantava amor em corações sangrados por mágoas perfurados. Leoa-mãe fiz nascerem outros golfinhos e neles identifiquei minhas próprias mutações. Quando a vida de mim fez caça, numa fera-fênix me auto-fecundei para parir na alma um bicho alado e forte... E descobri-me, finalmente, Semente-Eterna-Divina plantada novamente na cartola-mágica dessa terra-mãe para repartir o amor do Pai Celestial. Bicho-Deus em transmutação de anjo cósmico da grande morada ao lado do Criador, nosso Pai Eterno. Amém! 9 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 10. Ipê amarelo Foi no teu amarelo-ouro, De tristeza e solidão murmurantes, Que eu descobri a vida, Em meio à mumificação dos jardins, No cerrado costurados. Foi no teu amarelo-ouro, Sustentado por galhos secos, Que eu vi a tua esperança em vida, O teu inconformismo na morte, O teu grito de amor aos estéreis esqueletos inertes, À pasmaceira do olhar que te descobre ... E por esse quase-nada Descobre-se o que ainda-é-tudo. Percebe-se que, apesar do cinza-mortalha, Nesta terra alguém está vivo, em amarelo solar de energia! ...E por um quase-nada, Apenas um ser em flor, Solitário na grama cinza: É preciso ser valente, Fazer festa sobre as mortalhas, Explodir em vida A seiva divina da procriação perpetuadora, Apesar... 10 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 11. Reação Grita! Senão o mundo massacra você, Como massacra a britadeira as pedras inertes. Fala! Vomita as úlceras e hérnias, Movimenta o corpo, Antes que seu próprio sangue deixe de circular, Antes que seus músculos parem, Entorpecidos, alheios à translação. Não pára! “Se ficar o bicho pega”, E correndo pode ser que escape. Anda! Levanta do macio ortopédico de cetim, Tira o pé do chinelo aveludado, Vai correr pelas calçadas, Chutando no gramado uma bola sem compromisso. Surfa na onda da vida, Vencendo seu próprio medo, E a inércia do cotidiano. Arregala os olhos para o mundo E vê o que ainda resta dele: Dos seus jardins-lixo, Das suas crianças-lixo, Das cinzas nas matas: 11 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 12. Tudo carvão. Abra os braços e espreguiça, Arrota o comodismo hereditário, Que o tempo está passando! Enfrenta, fica gigante, Ainda que para isso seja preciso Agredir todos os contextos-monótonos Do seu status social com suas estruturas burguesas. Esqueça as programações tirânicas dos códigos mofados: Abandona o sistema castrador, Deixa seu cadastro-caduco, Deixa de ser acessório da engrenagem consumista. ... E, por último, faça uso-capeão da sua ilha, Toma posse de você! 12 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 13.
  • 14. Surfa na onda da vida, vencendo seu próprio medo.
  • 15. Desanoitecer ...E agora que os fantasmas se vão, Carregados pela madrugada, Montados em copos e rótulos: Já não sangra mais a ferida aberta, Já não dói tanto a dor escondida. Agora que o sangue jorrado Misturou-se no riso, Agora que o soluço sentido Confundiu-se no canto dos cantos da rua. Agora que os fantasmas se foram, Posso ir-me também, Só, com a minha solidão, Só, como em todas as voltas... [1976] 15 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 16. Sol-s-tício O sol está morrendo Em entretons de vermelho e laranja. O dia está no fim Para que a noite aconteça Em luares de prata... Pardais apressados procuram seus ninhos. As árvores adormecidas, embaladas pela brisa que sopra suave, Sobre a terra morna. Ao longe, o piar de algum pássaro notívago, Que, como eu, não conseguirá dormir, Que, como eu, não achará seu ninho, Não sentirá a brisa, Não será embalado... Ficará só, Só, Observando os que estão em paz, Só, Ouvindo o ressonar tranqüilo Dos que ainda são felizes... 16 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 17. Uma só vez Quem verdadeiramente amou, Sabe que nunca mais de uma vez: Porque a dor do amor Nascido, Sentido E inexplicavelmente desaparecido É intensa, grande, E possessiva dos espaços e tempos. Quem, n’alguma vez amou, E deste amor naufragou: Encolheu-se, Escondendo-se Na solidão abraçada. 17 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 18. Despedida Pior que ficar É ter que ir. Aqui um resto de mim em tudo Lá, só o relógio preguiçoso Que não corre para a noite chegar. “Felicidade” não foi embora: Ficou em cada lembrança, Disfarçada em saudade... 18 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 19. Chuvarada A chuva ensopa a vidraça, Onde tanto sol já bateu. Curva as árvores, Molha os pássaros, Transborda os ninhos... Por todo lado lama escorrendo, Gente encolhida, sem vontade de nada... Alma dormente, mente-dormente, fogo ausente... É inverno! Inverno nos jardins, No céu e nas ruas. É inverno lá fora, É inverno em mim... 19 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 20. Nada mais resta As lágrimas disparam carreira no meu rosto, Onde o peito fez gigantescas crateras. Tanto passado me alucina, Tanta solidão me enlouquece. Em minha rua deserta, Nenhuma janela aberta, Ninguém a me esperar... Como ocultar A dor em mim suspensa? Como ocultar Um coração intranqüilo, Que morre de fome e sede De lembranças inexistentes, Agora que nada mais resta da paisagem De grandes ilusões frustradas, Agora que só resta o vazio E a ânsia das palavras Murmuradas ao vento... 20 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 21. Selva-geria Mora em mim Uma tristeza forte, Constante e imutável. Mora em mim Uma fera devoradora, Implacável e assassina. Um bicho-grande Que me amedronta, Um bicho-mau Que me apavora. Mora em mim uma tristeza-fera A me arranhar com as garras, A me morder com as presas, A me queimar com seu fogo. Mora em mim Um fantasma, Uma força bruta, Que me rouba o riso E me carrega ao inferno: A lágrima louca; O grito rouco Da solidão indomável. 21 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 22.
  • 23. Alma dormente, mente-dormente, fogo ausente... é inverno!
  • 24. Simbiose Esta solidão, tão minha, Eu a penetro E por ela sou devorada. Dentro de mim nós nos perpetuamos: Ela me fecunda e eu a gero Como o sol gerou a chuva Como a chuva gerou o mar. Coexistimos em proximidade Nos infinitos opostos, Que sem se tocarem Se unem no além: No inexplicável espaço Entre o sol e o mar... 24 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 25. Amigo Em um lugar qualquer; Em sendo qual for a hora; Vestido em cor preta ou branca; Mesmo não sabendo usar pincéis; Nem solfejar notas musicais; Mesmo não dizendo poemas... Em um lugar qualquer Poderás fazer um amigo. E a ele não interessarão os teus mestrados, Nem a tua cultura e quinquilharias... Porque não precisas de nenhuma técnica Para conseguires amigos. Terás apenas que saber ouvir, Quando ele precisar falar, E terás que falar no momento exato Em que ele precisar ouvir-te. Não precisarás ser puro, nem de todo impuro, Mas não poderás ser vulgar. Terás que ter ressonâncias humanas e siderais, Quando todas as respostas dele forem cibernéticas. E não precisarás saber do Picasso, Dos noturnos e das “polonaises”; Mas terás que senti-los, Como sentes as gotas de chuva e de orvalho; Como sentes o anoitecer, 25 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 26. O riso e o pranto. Terás de ser adulto, Quando ele disser “coisas infantis”; E terás que ser criança para fazê-lo sorrir, Quando ele estiver envelhecendo em preocupações. Terá que ser tudo isto, e além de tudo, Terás que lembrar-te de que não és máquina-programada, E que por essa razão poderás errar um pouco, Para talvez no momento da tua falha Descobri-lo teu amigo também... 26 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 27. Eterno partir Sou como a estrela parada e sem luz, Num oceano de melancolia. E tudo em mim busca amor E não há amor em lugar algum... Vivo um eterno partir, Na minha vontade louca de ficar... Se olho o céu, me sinto tonta Com a quantidade de estrelas, Fico cega, com tanta luz; Acostumada que estou Com o negrume cá debaixo. E ao descobrir estrelas que se movem, Descubro também que a vida continua, Que o tempo não parou, E que só em mim existe morte... 27 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 28. Morfologia Não sendo capelo ou gaivota, Não sendo soldado guerreiro, Nem o Vietnã conhecendo, Não sabendo dos horizontes distantes, Não sendo muito tubarão, Nem tão pouco piabinha; Perco-me nas entrelinhas, Sem definição dos espaços, Sem tempo marcado, Nas marcas de amor... Históricas crateras, De extintos vulcões em geografia distinta Na mutilação morfológica... 28 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 29. Mecanismos Penso, logo existo! Mas não existo só porque penso. Máquinas não pensam e existem! Condicionadas pela precisão mecânica: Eu condicionada pelos condicionamentos Mecânicos-psicológicos. Alimento as máquinas E elas mesmas me alimentam. O corpo da máquina é como meu corpo: Que se alimenta, se cansa e um dia Deixa de funcionar. A meu favor Apenas a opção da autodestruição. Do querer desligar porque tenho frio, calor ou sono. Do poder deixar a máquina, E fazer o cérebro viajar, E transpor em tempo e espaço As correntes aprisionadoras: Capazes de conter máquinas, Porém nunca a mente livre. 29 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 30. Momentos mágicos Existem momentos mágicos Eternos... Existem momentos cristalizados Em tão pequenas lembranças... Existem momentos viajantes do tempo E do espaço Momentos posseiros dos nossos pensares Cravados nos ponteiros deste relógio neurológico, Marcando este tempo de solidão... Eu tenho estes momentos, E deles sou escrava Querendo escravizar você! 30 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 31.
  • 32. E ao descobrir estrelas que se movem, descubro também que a vida continua.
  • 33. Reforma Da tua estrada faço minha viela, Se do meu atalho fizeres estrada ... E planto margaridas e violetas, Onde fizestes existir asfalto e concreto ... E rabisco poemas em cima dos teus extratos bancários. ... E troco teu DVD Por um dedilhar de viola, Teus projetos racionais, Por um bilhete de amor. ... E destruo as marcações da pista pavimentada Para dar-te a liberdade Das tuas próprias limitações, Que também são minhas, Em contextos opostos... 33 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 34. Albumina Preciso que ressurjas em mim, agora Como a fé nos desesperados surge. Para que eu possa Levar uma gota de orvalho Desta terra amaldiçoada, Onde só em ti Me encontrei Quando sem ti já nada mais importava. 34 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 35. Vagabundo Louco vagabundo da noite, Rouco Romeu – trovador Sua boca eu apenas escuto Pois embora seja vacinada Sua mordida não me morderá! Poeta dos substantivos Femininos plurais, Não faça mais versos aos nomes Pois são apenas os rótulos, Dos conteúdos Que você não percebe. Ah, jovem narciso Quanto vazio por traz desse espelho, Quanta solidão debaixo daquela cama, Quanto automatismo no abater das lebres. A sua disritmia, Que a tanta mulher enlouquece É a mesma da qual queria você isentado. Acorda esta cabeça, Faz descansar seu sexo-viciado Faz acordar seu sentimento! Pára de criar fantasias, De sonhar utopias, De fazer alegorias. Deixa de ser o rei momo 35 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 36. Para na veste de um pierrô Ser apenas um figurante Da sinfonia global. Louco homem, eu, mulher louca também, Velha guerreira das dores, Por uma questão estratégica Vou aumentar nosso espaço E me fazer disparar no vento... Adeus! 36 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 37. Apenas canto Canto uma esperança desatinada, Canto uma paz que não tenho... Canto como louca, Enquanto meu peito chora num soluço, a dor da solidão. Ah! Se soubessem o que vai em minha alma, Ah! Se soubessem de mim, Na certa zombariam, Na certa se afastariam: Por isso canto: Para que não saibam do choro fantasiado de canto... 37 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 38. Insanidade Nas noites insones do meu cansaço vadio; Na solidão do silêncio irritante, estático e profundo; Agredida pelo luar que estupra as cortinas exigindo passagem; Pairando nos espaços de tempos antigos, em monólogos estéreis; Na magia macabra das dores guardadas; Ressoa no ar um grito esganiçado, Erguendo da cama O corpo trêmulo da mente confusa: Porque as paredes se movem e o teto, num bailado convulsivo, Flutua em espaços abertos de horizontes purpúreos. Porque os livros enfileirados na prateleira poeirenta Entoam canções natalinas para os duendes risonhos que pululam nas jarras, Porque tudo enlouquece numa mutação incompreensível... E quem foi já não é mais, Quem quis ficar teve que ir, Quem era mudo, falou, E quem objetos usava, virou objeto agora. Para ser usado também... 38 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 39. Água do céu Como aquela árvore Ou como aquela flor, Há dias que te esperava. E chegastes na luz dos raios, no barulho dos trovões Voltastes a mim, E me encontrastes como na última vez: Só, na vidraça embaçada a esperar. Me sinto em paz, Sem angústia, Sem solidão, Agora que tuas gotas molham as árvores e o vidro... Por que demorastes a vir? Eu aqui esperando para uma conversa, Para não me sentir tão sozinha, valsando em espera. Ficarás por um momento, E conversaremos: De poesia, madrugadas e estrelas... Entrarás pela janela aberta inundando meu corpo, Molhando os meus cabelos. Entre, chuva, Vem fazer cachoeira em mim... [18 de outubro de 1973] 39 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 40.
  • 41. E planto margaridas e violetas, onde fizestes existir asfalto e concreto.
  • 42. Infinitas lembranças Não se esqueça... Não se esqueça dos meus rios, Minhas matas Minhas grutas Não se esqueça... Dos gemidos, Dos voares em céu aberto Não se esqueça de nada. Não deixe a saudade acordar. Não programe nada. Não defina. Não equacione. E, principalmente: Não multiplique, não some, Nem divida. Apenas não se perca no espaço, Apenas não se esqueça de mim Apenas, Nos deixe existir... [19 de julho de 1979] 42 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 43. Singular Eu, Solidão Bicho-fera Ilha: Em espaço – isolada Eu, Pedaço De dimensão-programada Em infinito deserto. Eu, Noite de inverno Vazia – calada! Eu, Primeira pessoa Do singular nós Eu, Monossílabo! 43 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 44. Cio de amor É neste cio de amor Que te procuro Madrugada morrendo Morrendo de solidão: Louca vontade Rouca de beijos Rolando no tempo, Morrendo na insônia Acampada nos lençóis... Na mesma cama de ontem... 44 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 45. Átomo Um ponto branco, Branca areia contra o mar O sol me toca E eu nada mais sou que um ser Possuído pela grandeza cósmica... Quando a escuma me beija, E em bolhas lambe os meus pés, Eu me entrego com indolência e passividade... E na lentidão compassada dos seres cósmicos Imensos, eu aprendo a possuir, Sem me apossar, Sem deixar de ser Nada mais que um ponto: Só, na areia fria! 45 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 46. Medidas de segurança Mantenha a porta fechada: Não deixa entrar Nenhum amor por descuido: Não deixa acampar. Cerca suas terras Com cercas de arame, Tranca as janelas, Não deves se arriscar. Mantenha a porta fechada Esquece da vida: Não vale tentar. Percorra as noites, os dias: sozinha. Engole o sorriso, o pranto, E mesmo sem encanto Fique no seu canto. Até a dor se acalmar.... (1979) 46 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 47. Equações Para que placas, leiloando Alardeando publicamente, vendedores. Para que prados, pradarias, formalizados Para que praias, lamentando pranto: Quartzo prateado. Para que prateleiras, fragilmente presas: Predestinadas. Para que prece, proferida, irrefletida: Determinada. Por que prazo, Calculado? Possível antecipação: Precipício, Matrix! 47 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 48. Viagem ... E porque Não moras no mar Terei que esperar pela chuva, Para na enxurrada da rua, Chegar à tua calçada. Pra quem sabe Fazer-te estrada, Embora Prefiras vielas... 48 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 49.
  • 50. E porque não moras no mar, terei que esperar pela chuva.
  • 51. Peito ferido E te amo Numa loucura tão insana, Tanto insano se fez o coração Te amo Te quero E preciso de tudo Que me mostras agora Para depois Esconder nalgum poço Todo o medo Desta loucura E preciso esquecer Que me fiz máquina Pra sendo tua Perder o medo, E te amar longe das delimitadas-limitações... 51 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 52. Semente-sementeira Acho que foi o vento, Ou talvez a maré Que trouxe um dia A plantinha nova: Semente, Pra junto da velha planta: Sementeira ... Sei lá, se foi a surpresa do encontro Sei lá, se foi o chegar sem licença Naquelas terras tão próprias. Quis a semente Ser sementeira, Sementeira - semente. Nesse querer de mutualidade Semente – sementeou Sementeira – semeou Semente Ensinando sonho Sementeira Sem sonho ensinou E juntas pensaram que Bom seria Se o vento fosse dormir E a maré aquietasse... 52 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 53. Que bom seria Tivesse a semente Ser sementeira sempre Não tivesse a sementeira Semear-estéril... 53 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 54. Acaso Olha, moço Sabemos que foi sem querer, Ou talvez, Por querermos demais Sabemos um montão de coisas E ao mesmo tempo, Sabemos um montão de nada E sei também Que você não sabe, Que na minha embriaguez De desamor Você fez acontecer Uma vontade doida de amar, Uma sede enorme de você... 54 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 55. Terra de ninguém És a gaia, Da crosta fingidamente estéril. És a cabeça-viking, Desse coração italiano, Dessas manias piratas És o solo A se satisfazer com os ciganos Que em ti acampam, pra uma noite de festa És a terra, Que frutificou em vão, Sem da colheita receber a sombra És o canteiro, Que recusa a semente Pra dela não ser privado. Que recusa o posseiro, Pra nele não se subjugar. És terra de ninguém Sem ninguém para te cultivar ... E quando os ciganos se forem, Deles só restando cinzas e ecos de gargalhada Talvez, de tuas entranhas não possa mais brotar Ao menos, a semente última. Talvez, o olhar as fogueiras que um dia Te fizeram arder, te faça chorar num repente Pelas sementes que te negastes a receber 55 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 56. ... E descobrirás, então, que por algumas Colheitas perdidas, perdestes também a tua Própria razão de existir. E te descobrirás verdadeiramente mumificado: A terra em todas as camadas, estéril! (1978) 56 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 57.
  • 58. Acorda esta cabeça, faz descansar seu sexo-viciado, faz acordar seu sentimento!
  • 59. Veleiro-vadio Era um mar imenso: - fechado Rodeado por montanhas: - fechadas E barco nenhum era permitido E pássaro nenhum sobrevoava... Mas o veleiro chegou: - aberto No espanto da fera só, As ondas Quedaram-se: - quietas... Dias e noites, veleiro e mar naquela Dança medrosa, de ritmo lento, Se conhecendo, se devassando, Parados no tempo, se prometendo... Hoje, velas abertas, O veleiro se vai... No mar, as ondas se escumam num Beijo final Nas montanhas, as matas-molhadas soluçam, Pedindo que os ventos se calem, Que façam o veleiro ficar... [1979] 59 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 60. Fome de amor Se eu me tivesse, Eu não me deixaria ser assim consumida, Não teria essa alegria sumida Não seria este ser sem jeito. Se eu me tivesse, Não teria este útero bêbado, Embriagado de desamor. Não teria esta garganta seca, Em grito, morta-esquartejada; Este peito mudo, surdo e incompetente Esta fome doida, Incontida. Esta fome velha, Imutável. Esta fome de você, De amor, murmúrios e risos. Esta fome me devora: Suga meu sono Come minha fome Dorme comigo, Quando acordamos, Um cigarro nos lábios Nos faz sentir beijando você. Se eu me tivesse, Na certa teria você... [28 de julho de 1980] 60 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 61. Cárcere Quem és tu, pesadelo humano; Destruidor mutilante de ideais filosóficos; Carcereiro do espírito, Semeador de ervas malfazejas? Quem és tu, fantasma umbilical; Carniceiro noturno dos pensamentos fugidios? Não vês, por acaso, que já destruístes bastante; Não percebes que agora só restam os restos; Que nada mais encontrarás para teus banquetes alienados? Quem és tu, pesadelo humano? 61 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 62. Vida circunscrita Pensando, Matutando, Ensimesmando... O olhar parado, perdido em algum horizonte; Os braços caídos, inertes ao longo do corpo; Os pés descalços, pendurados na amurada; Os cabelos esvoaçando ao vento dos pensamentos distantes... Tanto tempo, caminhos e gente; Tanto acontecer; Tanto andar... E agora a idéia da estrada em círculos Imutáveis sufocantes. No círculo de círculos infindáveis, os mesmos medos, As mesmas angústias, o mesmo posicionamento contrário. Pensando, Matutando, Ensimesmado, Sufocando-se em perguntas, Angustiando-se nas respostas. O corpo parado, inerte e estático. A mente agitada e confusa Debatendo-se Nas paredes do crânio... 62 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 63. Aviso Não se aproxime: Se seus olhos não forem horizonte, Se sua boca não salivar amor, Seu peito não rufar sonhos. Não precisa chegar, nem passar, nem olhar: Se o sêmen não ejaculado semear esperança De plantios, colheitas, Gosto de favo e de mel. Dispenso seu esqueleto-ôco, Sua íris mortiça, Seu peito calado, Sua boca seca. Dispenso seu pedaço, Porque preciso do inteiro... 63 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 64. Deserto Agora, nesta rede calada, As folhas paradas: Não resta ninguém... A lua dormente passeia no manto, Procura meu canto, Encontra meu pranto: Não resta ninguém... Chega o sol atrevido Invadindo o silêncio, Lambendo a dormência. Remexe em tudo, E tudo é um nada: Não resta ninguém... O mar beija a areia fazendo escorrer as pegadas, Roubando as marcas Da trilha de volta do meu pescador Na rede inerte, enxarcada de solidão Uma mulher se esvai Em hemorragia De pranto final, Solitária: Não resta ninguém! 64 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 65. Gaiola Na noite escura, parada e deserta, Paira no ar um grito incontido, Abortado num choro de mágoas envelhecidas, Estraçalhado em desejos rompidos, Embrutecido nas dores revividas... Na noite cansada, muda e inerte, Como pássaro noturno, engaiolada: De asas partidas, peito ferido, bico quebrado, Esvoaçando prisioneira na gaiola de prata, Com cadeado na porta... Nas angústias de ontem, No desespero de hoje, Na incerteza do amanhã; As neuroses adquiridas, decoradas e repetidas, As manias insolentes, inoportunas e chatas, As carências aumentadas e multiplicadas... Na noite escura, parada e deserta, O pássaro doente se acomoda no ninho vazio. Cansado da vida, Cansado do seu cansaço imutável, Cansado dos contextos impostos, Sem horizontes, Sem abertura... 65 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 66.
  • 67. Não se aproxime se seus olhos não forem horizonte, se sua boca não salivar amor, seu peito não rufar sonhos.
  • 68. Futurismo Choro lágrimas sobre o cadáver ainda morno, Desse passado adolescente. E no meu ser todas as agitações se anulam, Como as vozes nos campos moribundos. Nesta rua, agora deserta, a minha alma passeia, Desolada; Porém vagueia serena. Tão serena quanto só pode ser quem se sente só, Como os veleiros nos portos silenciosos. Preciso que surjas em mim, Como a fé nos desesperados surge Para que eu possa levar uma gota de orvalho, Deste oceano de água e sal. Preciso de ti agora, Que só ficou o vento frio a soprar nas minhas faces E a terra inerte a escorrer nas minhas mãos. Preciso que surjas agora, Quando tudo é estranho e silencioso, como um gemido, Quando estou acorrentada por mim mesma, À terra que sou eu mesma... Quero me abandonar a ti, Como a onda se abandona ao mar: Silenciosa, com lassidão... Pra fazer do passado uma lembrança envelhecida... 68 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 69. Caroneiro Surgiste na vida, repentinamente, Sem acontecimentos diferentes, Sem velas, sem vinho, sem guitarra... Surgiste em mim, E eu pensei que serias passageiro, Que acabarias logo. Que serias só por instantes, Que nos separaríamos depois, E nunca mais nos encontrássemos. Mas saiu tudo diferente. Foste ficando, Me ensinando a gostar, Me ensinando a te querer mais, Por um pouco mais... A culpa foi tua que mentiste. Também minha, porque acreditei. Sorte tua que me ganhaste. Azar o meu que te perdi, Depois de acreditar Que serias pra sempre... Azar o meu... 69 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 70. Telefone Na nebulosa incômoda do teu rosto escondido, Na estranha distância de tanta proximidade, No querer conhecer a matéria dessa energia sonora. Na hipótese de um muro, Erguido ao acaso dos condicionamentos sociais, Impostos, aceitos e desfrutados; A minha inquietude se faz presente Nos raciocínios balanceados, Nas neuroses escondidas dos sonhos massacrados... Na nebulosa incômoda das verdades escondidas, Uma possibilidade de fuga, No extravasamento dos desejos contidos, No fundo do poço escondidos... 70 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 71. Disneylândia Se eu fosse a Mônica, O Cebolinha ou o Mickey, Você viria mais cedo Pra ficar comigo. Mas por não ser nenhum deles Fico aqui jogada num canto, Mais parecendo o Pateta. 71 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 72. Natal Nas árvores enfeitadas, No movimento das ruas, Nas mesas fartas: Está escrito Natal! Só não o vejo em mim, em você, Nem nas pessoas agitadas que passam correndo. Não vejo nenhuma ajuda ao cego que atravessa a rua de crianças e velhos vestidos de fome, frio e abandono.... O que vejo bem são os doentes dos hospitais A esperarem em vão um abraço apertado, a dor apartada.. O que sei é que nos asilos e orfanatos, Nos casebres e abrigos esperam um Papai Noel que não virá: nunca passou, nem ficou... Ah, Natal! Você me disse que hoje se comemora o nascimento de Cristo... Como descobri-lo nas pessoas apressadas que me empurram ao passar, Como descobrir o Natal em você que se fez dono da festa de aniversário Para afogar-se feliz, no vinho, nas castanhas e nos presentes. Como achar Natal em mim, Se desconheço o perdão, Se vejo erros e não faço acertos, Não conserto nada, Nem mesmo, eu mesma. Nas árvores enfeitadas para o Natal, A minha oração aos que nos brancos quartos de hospital, 72 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 73. O sangue injetado de drogas, Rezam pela graça de sua cura, Por um sonho infindo só de esperanças acalentado... 73 Floral de Phoenix | Valéria Nóbrega
  • 74. Livro composto nos tipos NuSwift e Pristina. Versão impressa para presente pode ser encomendada pelo bia@projectsim.com Nossa missão é ajudar pessoas [físicas e jurídicas] a transformarem idéias em projetos e projetos em real ação [ou realização]. Nosso negócio é lidar com idéias. Agradecimentos especiais para Biagio Beatrice e Alexandre Brandão pelo apoio técnico. Todos os direitos reservados.